Lembranças de violência
Segundo o mestre Pombo de Ouro, os pais deveriam conhecer a academia em que seus filhos treinam, pois para a criança ou adolescente o mestre adquire um papel muito importante, capaz de influenciar a sua vida de maneira determinante.
Lembro-me de um episódio que aconteceu numa academia que eu freqüentava no final dos anos 90. Durante a roda, um dos capoeiristas levantou o outro acima da cabeça e o jogou com toda a força no chão. E depois disso, a roda continuou. O cara estrebuchando lá no chão, mas a roda continuou. Só que a mãe de uma criança que treinava na academia estava presente e foi conversar com o mestre: ela achava um absurdo que ele permitisse que seus alunos cometessem atos de violência como esses numa roda de capoeira e comunicou ali mesmo que seu filho não voltaria mais para a academia (e provavelmete para a capoeira). Fiquei meio de lado, escutando a resposta do cara: "A senhora há de convir que eu não posso controlar o impulso natural dos meus lutadores".
Ele não podia ou não queria? A verdade é que a conduta daquela mulher foi perfeita: foi assistir à roda em que seu filho jogava e, ao não aprovar a concepção de capoeira do grupo, tirou o filho das aulas.
Em outras rodas, já vi o jogo degenerar em pancadaria com puxões de cabelo, tapas e murros rolando por todos os lados, numa perda de controle absoluta dos jogadores. E o berimbau continuava tocando, denunciando a concepção de que para o mestre aquilo era capoeira. A perda do controle e a vitória dos instintos mais violentos -- cujo controle é o objetivo de todas as artes marciais -- eram aceitas nas regras daquelas rodas.
Em muitas dessas ocasiões, o mestre gritava -- "iê" -- mas os caras não paravam de se agarrar e de se socar; e nem o mestre esperava que o fizessem, pois na cabeça daquele grupo o próprio desrespeito ao comando significava uma afirmação da sua valentia, do espírito lutador que era valorizado pelo grupo. Os caras que se esmurravam "desrespeitando" a ordem eram o exemplo a ser seguido.
Acontece que, assim como a maioria dos capoeiristas associa a capoeira à diversão e à brincadeira, para algumas daquelas pessoas, o jogo acabou associado à violência, à perda total do controle dos próprios atos nas rodas que aconteciam nos fins de semana. E isso pode ser treinado todo o dia, e inclusive fomentado com o uso de anabolizantes.
Aqueles com tendências mais agressivas ou com uma história pessoal mais complicada foram os que entraram por esse caminho do descontrole, cujo desenvolvimento era estimulado pelo seu mestre, pois -- como afirma o mestre Pombo -- dentro do homem convivem tanto o assassino quanto o amigo leal e ambos podem ter o seu desenvolvimento estimulado pela capoeira dependendo do direcionamento dado pelo professor. Assim, segundo o mestre, uma pessoa agressiva deve aprender a controlar sua agressividade para utilizá-la no momento e na intensidade apropriados a cada ocasião.
E o pior é que -- e isso eu aprendi em 2 anos e meio de magistério -- o mestre pode estar passando, sem ter consciência, valores contraditórios. Por exemplo, a contradição entre as palavras e os atos de um instrutor e a discrepância entre a postura corporal, a expressão do rosto ou o tom de voz, podem ser percebidas pelo aluno.
Assim, ao valorizar a perda do controle, a valentia e o sentimento de que não se deve desisitir de uma pancadaria, o mestre não podia esperar que o "iê" fosse obedecido. Na verdade, o desrespeito a ele naquele momento era a glória tanto para o aluno quanto para si, pois a lição que ele ensinara tinha sido aprendida.
Lembro-me de um episódio que aconteceu numa academia que eu freqüentava no final dos anos 90. Durante a roda, um dos capoeiristas levantou o outro acima da cabeça e o jogou com toda a força no chão. E depois disso, a roda continuou. O cara estrebuchando lá no chão, mas a roda continuou. Só que a mãe de uma criança que treinava na academia estava presente e foi conversar com o mestre: ela achava um absurdo que ele permitisse que seus alunos cometessem atos de violência como esses numa roda de capoeira e comunicou ali mesmo que seu filho não voltaria mais para a academia (e provavelmete para a capoeira). Fiquei meio de lado, escutando a resposta do cara: "A senhora há de convir que eu não posso controlar o impulso natural dos meus lutadores".
Ele não podia ou não queria? A verdade é que a conduta daquela mulher foi perfeita: foi assistir à roda em que seu filho jogava e, ao não aprovar a concepção de capoeira do grupo, tirou o filho das aulas.
Em outras rodas, já vi o jogo degenerar em pancadaria com puxões de cabelo, tapas e murros rolando por todos os lados, numa perda de controle absoluta dos jogadores. E o berimbau continuava tocando, denunciando a concepção de que para o mestre aquilo era capoeira. A perda do controle e a vitória dos instintos mais violentos -- cujo controle é o objetivo de todas as artes marciais -- eram aceitas nas regras daquelas rodas.
Em muitas dessas ocasiões, o mestre gritava -- "iê" -- mas os caras não paravam de se agarrar e de se socar; e nem o mestre esperava que o fizessem, pois na cabeça daquele grupo o próprio desrespeito ao comando significava uma afirmação da sua valentia, do espírito lutador que era valorizado pelo grupo. Os caras que se esmurravam "desrespeitando" a ordem eram o exemplo a ser seguido.
Acontece que, assim como a maioria dos capoeiristas associa a capoeira à diversão e à brincadeira, para algumas daquelas pessoas, o jogo acabou associado à violência, à perda total do controle dos próprios atos nas rodas que aconteciam nos fins de semana. E isso pode ser treinado todo o dia, e inclusive fomentado com o uso de anabolizantes.
Aqueles com tendências mais agressivas ou com uma história pessoal mais complicada foram os que entraram por esse caminho do descontrole, cujo desenvolvimento era estimulado pelo seu mestre, pois -- como afirma o mestre Pombo -- dentro do homem convivem tanto o assassino quanto o amigo leal e ambos podem ter o seu desenvolvimento estimulado pela capoeira dependendo do direcionamento dado pelo professor. Assim, segundo o mestre, uma pessoa agressiva deve aprender a controlar sua agressividade para utilizá-la no momento e na intensidade apropriados a cada ocasião.
E o pior é que -- e isso eu aprendi em 2 anos e meio de magistério -- o mestre pode estar passando, sem ter consciência, valores contraditórios. Por exemplo, a contradição entre as palavras e os atos de um instrutor e a discrepância entre a postura corporal, a expressão do rosto ou o tom de voz, podem ser percebidas pelo aluno.
Assim, ao valorizar a perda do controle, a valentia e o sentimento de que não se deve desisitir de uma pancadaria, o mestre não podia esperar que o "iê" fosse obedecido. Na verdade, o desrespeito a ele naquele momento era a glória tanto para o aluno quanto para si, pois a lição que ele ensinara tinha sido aprendida.
3 Comments:
Moreno,
Como entender o que aconteceu com a capoeira????? Recentemente, ao entrar em uma comunidade de relacionamento sobre capoeira, a questão a ser discutida era: qual o golpe mais mortal da capoeira? A partir daí foi uma sequencia de declarações que coloca o vale tudo no "chinelo". Os acontecimentos tem nos levado a pensar várias coisas, entre elas, sobre o preconceito a ser vencido.
Será que os capoeirista não estão "marginalizando" a nossa arte? Coisas para pensar...
Um abraço
Andreia
Caro Moreno, essa coisa da veneração do mestre pelo aluno é algo complicadíssimo. Para você ver, treinei num lugar parecido durante alguns anos, apesar de ter algumas crises quanto à violência das rodas, ao uso de anabolizantes pelos graduados (um estímulo não- verbalizado do doping para os alunos) e outras coisas mais. Apesar disso, havia uma necessidade de aceitação pelo grupo muito forte, não só de minha parte, mas também da de todos os colegas.
Fala Adriano!
Maneiro o seu blog sobre capoira!
Recomendarei a todos, e em especial ao Mestre Veinho e aos amigos do Grupo Araúna Brasil (www.araunabrasil.com).
Capoeira Sempre!
Abraços, irmão.
Fred
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