Postagem de batismo
Postagem de batismo
Caros leitores, fico feliz em registrar que essa é a primeira postagem inédita que vai para a minha coluna no Jornal Mundo Capoeira. A hospedagem desse site foi acertada num batizado de capoeira em Arraias - TO. Assim, não será por acaso que a crônica de estréia será um comentário sobre os bastidores daquele evento. Com essa postagem, considero a minha coluna devidamente batizada e pronta para entrar num universo mais amplo dos leitores amantes da capoeira.
Nessas viagens de capoeira, é comum encontrarmos figuras interessantes, meio malucas à primeira vista, mas capazes de provocar insights bacanas. Pois bem, nesse evento havia o encarregado das filmagens das rodas, do papoeira e do batizado em si. Acontece que esse rapaz era um evangélico estudioso do judaísmo e ele ficou entusiasmadíssimo quando viu o símbolo da capoeira regional nas camisas de alguns dos participantes do evento: a Estrela de Davi (ou o "Cinco Salomão") encimado por uma cruz e com a letra "R" no seu interior.
A partir daí, parece que um botão de liga-desliga que existia em sua cabeça foi pressionado e ele começou a "viajar": mestre Bimba e até Zumbi dos Palmares viraram judeus! Zumbi -- segundo nosso câmera -- era um judeu-africano escolhido por Deus para levar seu povo à liberdade.
Ora, acontece que as coisas não são tão simples assim. Os símbolos de uma religião podem muito bem receber outras interpretações feitas por aqueles que o acolhem. Sabemos que na Salvador do século XIX -- como escreve João José Reis -- era comum o uso de amuletos pelos africanos e seus descendentes. Tais amuletos tinham diversas origens: européia, africana, católica, islâmica ou pagã. Patuás, figas, dentes de coelho, orações islâmicas dobradas e penduradas no pescoço eram alguns deles. Tais amuletos teriam a função de espantar os maus espíritos do seu portador. Teriam poderes mágicos contra feitiços.
Segundo Mary Karash, estudiosa da vida dos escravos na cidade do Rio de Janeiro, um dos elementos principais das religiões banto seria a crença no poder mágico de determinados objetos, que podiam ser os mais variados, e até estátuas de santos católicos.
Sendo assim, cabe a afirmação: os capoeiras da cidade de Salvador interpretavam a estrela de Davi de um modo muito diverso daquele dos judeus. Talvez mesmo como uma espécie de patuá.
* * *
Acabo de assistir a um documentário na TV sobre a influência das culturas africanas na sociedade brasileira. Em determinado momento, apareceu o presidente do Afoxé Filhos de Gandhi falando da criação desse bloco carnavalesco. Fiquei sabendo que ele foi formado em 1949 por estivadores de Salvador, a maioria filhos de santo, que quiseram homenagear o ideólogo da resistência pacífica como forma de protesto e um dos líderes da independência indiana -- acontecida no ano anterior .
Frente a esse fato, gostaria de saber que significado aquelas pessoas atribuíam às ações do líder indiano, em que ponto as idéias de Gandhi combinavam-se com as deles, em que ponto afastavam-se e por que diabos os caras acharam que Gandhi tinha a ver com o carnaval.
* * *
Parece que esse mundo é mesmo muito louco. Um símbolo religioso ou político pode ser interpretado de várias maneiras dependendo da realidade de quem o recebe. De repente, nossos botões de liga-desliga estão sempre na posição "on". Isso até faz a gente se interessar pelo motivo do entusiasmo daquele rapaz pelo judaísmo.
Caros leitores, fico feliz em registrar que essa é a primeira postagem inédita que vai para a minha coluna no Jornal Mundo Capoeira. A hospedagem desse site foi acertada num batizado de capoeira em Arraias - TO. Assim, não será por acaso que a crônica de estréia será um comentário sobre os bastidores daquele evento. Com essa postagem, considero a minha coluna devidamente batizada e pronta para entrar num universo mais amplo dos leitores amantes da capoeira.
Nessas viagens de capoeira, é comum encontrarmos figuras interessantes, meio malucas à primeira vista, mas capazes de provocar insights bacanas. Pois bem, nesse evento havia o encarregado das filmagens das rodas, do papoeira e do batizado em si. Acontece que esse rapaz era um evangélico estudioso do judaísmo e ele ficou entusiasmadíssimo quando viu o símbolo da capoeira regional nas camisas de alguns dos participantes do evento: a Estrela de Davi (ou o "Cinco Salomão") encimado por uma cruz e com a letra "R" no seu interior.
A partir daí, parece que um botão de liga-desliga que existia em sua cabeça foi pressionado e ele começou a "viajar": mestre Bimba e até Zumbi dos Palmares viraram judeus! Zumbi -- segundo nosso câmera -- era um judeu-africano escolhido por Deus para levar seu povo à liberdade.
Ora, acontece que as coisas não são tão simples assim. Os símbolos de uma religião podem muito bem receber outras interpretações feitas por aqueles que o acolhem. Sabemos que na Salvador do século XIX -- como escreve João José Reis -- era comum o uso de amuletos pelos africanos e seus descendentes. Tais amuletos tinham diversas origens: européia, africana, católica, islâmica ou pagã. Patuás, figas, dentes de coelho, orações islâmicas dobradas e penduradas no pescoço eram alguns deles. Tais amuletos teriam a função de espantar os maus espíritos do seu portador. Teriam poderes mágicos contra feitiços.
Segundo Mary Karash, estudiosa da vida dos escravos na cidade do Rio de Janeiro, um dos elementos principais das religiões banto seria a crença no poder mágico de determinados objetos, que podiam ser os mais variados, e até estátuas de santos católicos.
Sendo assim, cabe a afirmação: os capoeiras da cidade de Salvador interpretavam a estrela de Davi de um modo muito diverso daquele dos judeus. Talvez mesmo como uma espécie de patuá.
* * *
Acabo de assistir a um documentário na TV sobre a influência das culturas africanas na sociedade brasileira. Em determinado momento, apareceu o presidente do Afoxé Filhos de Gandhi falando da criação desse bloco carnavalesco. Fiquei sabendo que ele foi formado em 1949 por estivadores de Salvador, a maioria filhos de santo, que quiseram homenagear o ideólogo da resistência pacífica como forma de protesto e um dos líderes da independência indiana -- acontecida no ano anterior .
Frente a esse fato, gostaria de saber que significado aquelas pessoas atribuíam às ações do líder indiano, em que ponto as idéias de Gandhi combinavam-se com as deles, em que ponto afastavam-se e por que diabos os caras acharam que Gandhi tinha a ver com o carnaval.
* * *
Parece que esse mundo é mesmo muito louco. Um símbolo religioso ou político pode ser interpretado de várias maneiras dependendo da realidade de quem o recebe. De repente, nossos botões de liga-desliga estão sempre na posição "on". Isso até faz a gente se interessar pelo motivo do entusiasmo daquele rapaz pelo judaísmo.
Moreno
0 Comments:
Postar um comentário
<< Home