quinta-feira, abril 29, 2010

Besouro e Madame Satã

Analisando as formas de filmagem da capoeira de "Besouro" e de "Madame Satã", percebi que este se inspira naquelas gravuras de Kalixto-- bem conhecidas no meio da capoeira -- datadas de 1906 onde aparecem desenhos de malandros se enfrentando. Tais desenhos, além de retratarem aqueles personagens das ruas cariocas, acabam reproduzindo também alguns dos trejeitos de corpo por eles utilizados na luta da capoeira. O próprio figurino do personagem corresponde aos desenhos.

O corpo de Satã não é filmado por inteiro durante as cenas de luta, mas não para disfarçar a -- improvável -- inabilidade de Lázaro Ramos na capoeira, mas para dar a idéia de rapidez e do caráter inesperado dos golpes, os quais só são percebidos pelo espectador no momento em que atingem o alvo. Em suma, o objetivo da câmera é retratar a "mandinga" e a violência presentes na capoeira dos malandros da Lapa do começo do século XX.

Já Besouro se aproxima da capoeira de outra forma. No início do filme, vemos uma cena de luta entre Besouro e os assassinos de mestre Alípio. O herói é filmado de corpo inteiro, seus golpes e sua base são aquelas identificadas com a atual capoeira regional, com golpes esticados e base formada a partir de músculos tensionados. As rodas também seguem o modelo da regional de hoje em dia. E isso também é uma escolha, pois afinal sabemos que havia outros tipos de roda que poderiam ter sido escolhidos: a vadiação no barracão de mestre Waldemar,a capoeira jogada nas docas de Salvador, as rodas dos mestres Bimba e Pastinha, e por aí vai. Mas isso é o de menos, o diretor tem o direito de filmar a capoeira da forma que ele desejar.

O que chama atenção no filme é mesmo o filmar a capoeira como se faz com as artes marciais orientais em fitas que tiveram grande sucesso comercial. O próprio diretor argumenta ter feito uma tentativa de se criar um super-herói nacional, que pratica uma luta brasileira. Ou seja, “Besouro” faz uma interpretação da capoeira ao modo de “Matrix”, “O tigre e o dragão”, Jackie Chang e Jet Li. E nisso não estou fazendo nehum juízo de valor. É a saga do herói contada de forma bem convencional, utilizando elementos da cultura afro-brasileira. Não chega a ser ruim, mas também não é um estouro.