"Então, é Natal..."
Camaradas, percebi que nas postagens anteriores ressaltei alguns aspectos negativos que acontecem no meio da brincadeira. Mas hoje é Natal e em breve estaremos num novo ano. E nesse clima de otimismo e fraternidade eu apresento alguns desenvolvimentos positivos do brinquedo percebidos por mim neste ano.
Já escrevi sobre uma tradição de disputa entre grupos, mas, paralelamente a ela, vem se desenvolvendo outra, de cooperação. Já presenciei reuniões de capoeiristas aqui em Brasília onde muita coisa construtiva foi decidida; estive presente num "papoeira" feminino onde foram discutidas questões de gênero na vadiação, a inserção da mulher na capoeira, além da prevenção a lesões de coluna.
A própria criação de um fórum de discussão como o "papoeira", idealizado pelo Mestre Pombo de Ouro, é uma oportunidade em que acontece a troca de idéias entre vários mestres e professores do DF e uma forma de promover a cooperação e o melhor entendimento dos mestres dentro do nosso meio.
A criação da Praça do Capoeirista no Zoológico de Brasília também foi um marco importante que aconteceu nesse ano em Brasília, tendo à frente os mestres Adílson, Pombo de Ouro e o mestrando Baleado.
A Roda da Torre, promovida todos os domingos pelo mestre Kall, também completou mais um ano. Esta roda é também é um bonito momento de cooperação no qual capoeiristas do Plano Piloto e das Satélites, brancos e negros, brasilienses e visitantes, brasileiros e estrangeiros vêm vadiar, com muita malícia, mas também com grande dose de respeito, colocando Brasília no mapa nacional da capoeira. Aliás, não só no mapa nacional, pois tenho fotos da mesma roda publicadas numa revista da República Checa.
Em postagens anteriores do meu blog já frisei que a localização dessa roda na feira do Torre de Tv, um dos principais pontos de turismo e de convivência de Brasília, combina muito bem com a malandragem necessária para se jogar capoeira.
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Realizando uma avaliação pessoal do ano de 2006, lembro que fiz a minha primeira viagem internacional no mundo da vadiação globalizada. Fui a Portugal e à Polônia e vi coisas interessantíssimas. Em Portugal, presenciei a capoeira fazendo um retorno indireto a suas origens africanas: vi imigrantes angolanos entrando no meio capoeirístico de Lisboa.
Gostaria de ter conversado mais com essas pessoas para saber qual a sua visão do brinquedo, como eles interpretavam a vadiação e se relacionavam com sua africanidade e brasilidade. Pelo pouco que eu observei, eles possuem, dentro do meio da capoeira, um status mais elevado do que na sociedade portuguesa que os envolve.
A mesma coisa acontece com os próprios mestres brasileiros, que possuem certo status como trabalhadores culturais sendo, em geral, mais bem vistos do que os trabalhadores não-qualificados de mesma nacionalidade que estão presentes em grande número em Portugal, os chamados “brazucas”.
Na Polônia, tive uma surpresa com o alto nível dos alunos do mestre Jorge, do Beribazu. Camaradas que jogam e dão aulas em outros países europeus já me falaram que, em alguns países do Velho Continente, ainda não é possível jogar mais solto, realizando um jogo mais veloz e competitivo. Na Polônia, porém, encontrei capoeiristas de bom nível que não deixam nada a dever aos membros brasilienses do grupo possuidores de graduações equivalentes.
O interesse por tudo o que é brasileiro é patente entre os capoeiristas daquele país. Os alunos mais antigos falavam português fluente e se interessavam por samba, choro, frevo e funk carioca. Lá também a imagem do Brasil está muito ligada à alegria de viver, à espontaneidade. Chega a haver uma idealização muito grande da vida nas favelas brasileiras. Isso é até um pouco mais generalizado em Portugal.
Já ouvi falar que a identificação dos poloneses com o brinquedo, em contraposição à dificuldade de sua absorção por parte de povos de países com passado imperialista, teria a ver com a história de dominação vivida por aquele país, sempre às voltas com invasões russas e alemãs.
Vejam só que tempos interessantes de globalização: uma arte marcial que tem suas raízes na população escrava de origem africana transplantada para o Brasil -- fruto da capacidade de superação contra uma realidade adversa -- encontra ressonância no universo simbólico de um povo que teve que conviver com o domíno estrangeiro durante muito tempo de sua história. Uma situação próxima a da sujeição escravista, pelo menos na visão dos poloneses.
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Por hoje é só, camaradas! É com esse espírito de otimismo que desejo um feliz Natal e um Ano Novo cheio de realizações dentro e fora da vadiação a todos nós.
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